terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Análises semanais, e a tentação interminável de perder tempo


BOM, talvez minha introdução contenha algo difícil de acreditar, mas este não vai ser um daqueles vídeos de drama, refutações épicas, ou ataque as figuras da Gabi Xavier, ou ao Vídeo Quest. Na verdade nada diretamente voltado as pessoas ou muito do conteúdo deles será discutido, com a exceção do que é diretamente relevante a essa análise. Minha proposta se volta a criticar a mentalidade, e pratica de críticas semanais de episódios de anime, ou capítulos de manga. Este sendo um dos conteúdos primordiais dos dois canais. As limitações de escrever, e publicar reviews semanais para mim estão sempre presentes, e terminam por prejudicar a qualidade do produto final.

Primeiro, eu gostaria de ressaltar como a própria pratica de separar o objeto da crítica em únicos episódios, ou capítulos é extremamente arbitraria. Compare como um filme funciona em termos de unidade, enquanto um episódio de anime, ou capitulo de manga, não. Filmes são vendidos para contar histórias com começo, meio e fim, os quais são relativamente independentes de possíveis ligações, conexões, ou continuações. Tais são vendidos, criados e comercializados individualmente, não havendo muitas vezes nem ideia da possibilidade de uma sequência no momento de lançamento. Ademais se uma vier a existir, esta normalmente será publicada num espaço de 2 anos, ou mais do original. Logo filme é usualmente pensado como conjunto narrativo, e entidade separada, tanto no processo de criação, quanto na experiência e atitude da audiência em relação a obra.

Traduzindo a lógica para animes, e mangas, é bem obvio que o equivalente seria a série, ou conjunto de publicações de um manga como um todo. Episódios, salvo algumas exceções, não são primordialmente pensados como todos narrativos completos, contando histórias, ou arcos de personagem. Além disso sua estrutura, e eventos dependem principalmente de sua colocação e importância no contexto da historia. Séries, e mangas não são escritos ou feitos, se baseando na estrutura narrativa, ou duração de um único episódio. Se você considerar exemplos de animes adaptados de outras mídias, muitas vezes a divisão, momento de início e fim entre episódios, é completamente errática. Logo nem faz sentido buscar uma coerência ou razão por trás da separação.

A existência de blocos e separação de episódios apenas encontra sua razão em termos de como animes realizam propaganda, e são veiculados na Televisão. A cada obra é atribuída uma duração e horário especifico na Televisão, ou um espaço em uma revista semanal, ou mensal de publicação no caso de mangas (Não estou dizendo que sei exatamente detalhes, e estou gloriosamente simplificando a situação). No entanto esta não é a forma principal pelas quais animes são comercializados, uma vez que estes são vendidos em blocos contendo temporadas inteiras, nem a que são vistos, pois usualmente o conteúdo é maratonado como um todo por sua audiência.

Assim, não havendo um próprio senso de estrutura, ou razão na divisão, não consigo abstrair o raciocínio aonde episódios seriam vistos idealmente em termos de unidade. Tudo isso levanta a pergunta, porque tantas pessoas analisam e criticam episódios separadamente? Sério, eu realmente gostaria que alguém realizasse o argumento para essa prática, porque eu nunca achei apropriadamente um. Em como essa divisão primordialmente comercial, e de marketing, realmente deve ditar o objeto e muito do conteúdo de uma análise.

Obviamente a verdadeira resposta para isso se encontra na própria natureza do youtube, e das plataformas digitais, não na pratica da crítica ou criação de conteúdo. Sim o Youtube demanda que você crie vídeos num ritmo absurdamente rápido para crescer um canal, preferencialmente mais que 2 por semana. E não, não considero que haja nada desonesto nessa pratica, ela é quase uma necessidade, se você como criador, tem qualquer ambição financeira com a plataforma.  Mesmo assim, nesse espaço vou entrar em diversos problemas que youtubers caem ao se utilizar desse modelo, e suas inerentes limitações.

Como um caso de exemplo, vou ter que trazer a Gabi Xavier, pois ela ocupa uma posição especial como prolifica produtora de vídeos, especificamente desse tipo. Em seu conteúdo semanal, Gabi sempre cai naquela que considero a pior pratica em análises no geral, que é a de simplesmente descrever, e partir apenas para detalhar o que acontece num dado episódio.  Ao mesmo tempo agrega ou utiliza tais descrições para pouquíssimo em termos de crítica, ou para construir uma opinião sobre o material em si.

Note que não estou retirando o lugar particularmente importante que critica descritiva ocupa em qualquer análise. Ela pode ser um método importante para conseguir dar uma noção de diversos aspectos, por exemplo, o tom, a emoção, os detalhes. Muitas vezes a pratica de analisar se resume a encontrar os perfeitos eventos, que encapsulam perfeitamente a ideia que você quer passar.
No entanto, a diferença entre isso e um vídeo aonde metade do tempo simplesmente se relata o que acontece em um dado episódio, é óbvia. As descrições nesse tipo de vídeo não são adicionadas para examinar algo, exemplificar um ponto, ou criar alguma opinião sobre a obra. Ao invés disso tais se tornam a maior parte do efetivo conteúdo. Durante boa parte do tempo não consigo nem perceber o proposito por trás de muito desse detalhamento de eventos, eles não são acompanhados, nem de um julgamento de valor raso de certos méritos, um como isso foi legal, ou nossa, isso eu curti. Em relação a série de vídeos que estou me referindo, os da segunda temporada de One Punch Man, eu não estou exagerando, estes passam como quase um resumo, ou sinopse estupidamente longa, que você poderia encontrar na Wiki.

Sendo sincero, algo que eu adoraria entender é a filosofia ou razão por trás dessas descrições, para poder apropriadamente julgar o resultado buscado. Reviews usuais são comumente voltados a consumidores que não viram o anime, e querem ter uma melhor noção sobre se a obra é para eles. Nesse contexto pelo menos faz sentido um maior caráter descritivo, para a audiência pegar uma melhor ideia sobre o básico do material. Contudo analises de episódios são voltadas primordialmente (eu imagino), a pessoas que já assistiram o anime, sabem o que ocorre nele e querem saber exatamente a opinião e experiência do criador sobre os eventos. Ou seja, eu apenas enxergo, nesses longos relatos, e foco em transcrição da história, um desperdício de tempo para todo mundo assistindo.
O resultado é duplicar a duração de algo que poderia ser um vídeo curto, simples e direto ao ponto, assim como capaz de transmitir perfeitamente a opinião da autora. Com essa pratica, a análise, emissão de opinião, e reflexão sobre o apresentado se tornam quase secundarias, sendo desprezíveis quaisquer ganhos. Tal fenômeno para mim demonstra clara falta do que dizer, ou de constantemente ter algo relevante para falar, uma consequência direta de quando o objeto de análise é curto e incompleto.

Nesse ponto, eu irei contrastar a figura e práticas da Gabi Xavier, com as do Leonardo Kitsune do canal Vídeo Quest, este servindo como expansão do meu ponto. Kitsune evita de forma completa o relatado problema. Apesar de qualquer opinião que você possa ter sobre os argumentos dele (eu com certeza tenho uma), é claro que os meros eventos não são o tópico da discussão. Ao invés disso, o autor utiliza estes principalmente para exemplificar, demonstrar, e reforçar os pontos, mensagens e opiniões que quer passar.  Assim executando uma coerente, focada, e normalmente bem embasada, transmissão de sua opinião e reflexão sobre um episódio de um dado anime.
A partir de tal descrição seria simples pensar que o fato de realizar análises semanais, não está prejudicando o processo criativo e vídeos do Kitsune. Algo que eu realmente discordo, e pretendo demonstrar porquê.

O primeiro problema é obvio, ao analisar um episódio de um anime durante sua duração, tal pratica te impede de falar, ou ter o conhecimento do contexto geral da obra. Logo muito do que você expor em termos de personagens, narrativa, ou questões vai estar unicamente se referindo a uma única parte da série. Isso não parece tão importante isoladamente, mas pode levar a severas distorções.
Um exemplo claro, é como o Kitsune critica o episódio 4 de Promised Neverland, por ser basicamente um episódio de exposição e preparação para futuros eventos. Tal analise pode ser válida como uma crítica do episódio em si, no entanto falha em contemporizar e observar sua função e proposito dentro do trabalho.

Promised Neverland é um thriller, impulsionado principalmente pela tensão, e atividade de ver lentamente os esquemas e estratégias dos personagens desenrolando, e se desenvolvendo. Expectativa, o mistério, e suspense quanto a muitos dos elementos, e informações introduzidas, consistem dos pontos principais da série, os quais terminam por definir seu apelo, e qualidade. Logo ao simplesmente avaliar o episódio como um todo, o crítico tem que abstrair sua importância em relação a futuros eventos, assim como a eficácia do que acaba estabelecendo no contexto do anime. Pois pela mera natureza de como está publicando, ele está se furtando o conhecimento e capacidade de compreender a situação e todo no qual a exposição e introdução de elementos se colocam. (Ele ter dito que leu o manga não muda nada nesse ponto)

Meu argumento é simples, mesmo que se considere a usual defesa a reviews de episódios, que tais servem para comentar momentos, e eventos específicos, o que o crítico acaba fazendo, paradoxalmente torna a análise de únicas cenas e elementos localizados bem piores. Pois a atitude dificulta sobremaneira a pessoa de obter o melhor conhecimento, e capacidade de avaliar e opinar. Assim impedindo a ideal situação para localizar e contextualizar momentos em um todo. Por essa razão sempre me opus a pratica de análises semanais.
Outra questão bem óbvia, pela natureza do lançamento, é como a maioria do conteúdo acaba sendo especulativo. Eu digo isso não só no sentido de se falar de arcos de personagens, narrativos e elementos, muitas vezes com base numa suposição de onde tais estão indo e quais vão ser os resultados.  Muitas vezes a coisa vira literal, um se perguntar o que vai acontecer com esse personagem, qual será a revelação, e elementos a vir no próximo episódio.

Note que eu não sou um fã desse trabalho de realizar teorias, meramente ficar se perguntando o que irá acontecer a seguir num trabalho de ficção. No entanto, para mim é bem clara a diferença entre uma pessoa se perguntando por 2 anos, após Star Wars 7, quem são os pais da Rey, e o Kitsune se perguntando sobre se o Mista, ou Abbaccio, finalmente morreram de verdade após um episódio de Jojo. O primeiro é resultado da própria natureza de como tais filmes foram criados, que tiveram como um de seus aspectos principais o mistério de quem diabos seriam os pais da Rey. Assim o espaço para questionamento e interpretação são intencionais, parte integral dos filmes e de como devem ser avaliados. Isso não poderia ser mais diferente da atitude do Kitsune fazendo o mesmo quanto a Jojo parte 5.  No espaço de um episódio, e semana, teremos as respostas, e provavelmente descobriremos que as suposições são baseadas em nada. Mas independentemente de quão correta uma pessoa possa estar, quando imaginando o que pode ocorrer a seguir no anime, tais teorias não importam.  Pois os eventos e circunstancias as quais se referem não são escritas como mistério, ou algo a se especular sobre, e suas revelações não são de nenhuma forma um twist. A natureza e caráter de levantar dúvidas, e pensar sobre o que realmente aconteceu, ou vai acontecer unicamente existe por causa da publicação e analise da obra semanalmente, e não tem nada haver com como o trabalho é escrito, ou apresentado. Mal existe algo a se ganhar ou aprender com esses pontos, dado 1 semana quando do lançamento do próximo episódio.

O melhor e mais severo problema de realizar analises semanais é algo que deixei por último. Este, eu diria que é indiscutível para qualquer pessoa que já escreveu sobre anime regularmente. É estupidamente difícil, achar algo novo e particularmente interessante para dizer sobre um anime, every fucking week.  Um pequeno exercício mental ajuda a ilustrar meu ponto. Considerem a quinta temporada de Jojo, esta tem 37 episódios, e na maioria das semanas que o anime saiu, Kitsune fez uma publicação. Agora atribuam a cada vídeo, 10 minutos em média, dele falando unicamente sobre Jojo parte 5. Ao se levar essa lógica a suas últimas consequências, o Kitsune produziu 370 minutos de conteúdo sobre o anime durante diversas semanas, ou seja, aproximadamente um pouco mais que 6 horas, sobre JOJO.

Assim, você considera que o resultado da análise, os pontos, argumentos e opiniões produzidas justificam, e fazem valer a pena 6 horas de conteúdo corrido? Eu sinceramente acho que não, e o fato de todas as tentativas nesse estilo, produzirem vídeos de durações muito maiores que as necessárias para falar sobre um anime, demonstra uma impossibilidade no próprio conceito de reviews semanais.
As saídas para o problema de muito tempo, mas muito pouco para comentar são bem claras quando se maratona os vídeos. Observe que tais frequentemente voltam aos mesmos pontos, analisando logica (ou falta de) nas lutas, ou as habilidades de Stands. O ponto de os personagens serem o maior problema da parte 5 é constantemente reiterado, e pior, as conclusões as quais o Kitsune chega são usualmente as mesmas. Ou seja, caindo numa interminável repetição, volta as mesmas ideias, e comentários sobre a obra, espalhados em incrivelmente longo e frustrante conteúdo.

Talvez seja uma questão pessoal, mas eu considero evidente quando uma pessoa já elaborou todos os seus pontos, aplicou sua lógica, julgamento, opiniões, e chegou a completas conclusões sobre o material. Normalmente se esperaria que uma, ou duas horas seriam o bastante, para se elaborar tudo o que você conhece, acha legal, interessante, e merecedor de compartilhamento sobre um dado trabalho.

No entanto esse esquema te força a continuar a produzir, fazer um novo vídeo, falar as mesmas coisas, focar em trivialidades, ou coisas evidentes. Eu tenho que dizer, ISSO É UMA LOUCURA. A necessidade por conteúdo semanal, o qual deve ser rapidamente produzido, gravado, editado, e publicado pouco depois do episódio em si. É claro que isso mata qualidade.

Não sei, talvez minha discordância e critica venham principalmente de uma diferença ideológica. Eu considero o trabalho do crítico particularmente a integração de elementos dispares de uma obra. É claro que você está olhando e avaliando coisas muito diferentes, animação, personagens, música e narrativa. No entanto é como cada um desses elementos se integram a um todo, formam uma unidade e teor coesivo, isso é o que mais importa. A atividade do crítico é exatamente procurar esse todo, tais valores, qualidades e defeitos, para poder transmiti-los a uma audiência.  Por isso minha oposição é quase uma questão de princípios.

Mas ainda assim considero que há mais por trás da minha exposição. O trabalho de assistir reviews semanais, não como elas foram inicialmente pensadas, mas sim ver sem parar horas de conteúdo, isso é o exercício mais esclarecedor quanto aos possíveis problemas. Sério, eu convidaria cada um de vocês a tentar a atividade, e formar sua opinião sobre se tal é a forma mais concisa de apresentação de ideias, ou se constantemente compensa assistir novos vídeos. Os quais com certeza sempre apresentam pontos novos, e são um espaço para frutíferas discussões.

Concluindo, queria deixar claro que não escrevi isso com intenção de ataque, ou roast a algum dos citados.  É inegável que eles poderiam estar criando melhor conteúdo. EU também poderia estar fazendo algo melhor, trabalhando nisso, nesse exato momento. Minha intenção parte mais de mostrar, que são as próprias propostas, métodos de publicação, e dialogo em relação as análises, os quais não os permitem criar vídeos nas condições ideias, ou realmente realizar o melhor.

Creio extremamente na capacidade de auto aprimoramento e melhora de cada indivíduo. E tudo que eu espero que você possa tirar desse ensaio é: uma perspectiva nova em relação a como reviews semanais são percebidas e entendidas por uma parcela da audiência, ou alguma dica ou ideia útil que pode levar a produção de um vídeo melhor.

Enfim, como vocês devem saber não tenho nenhum poder sobre o tipo de vídeo que vai ser primordialmente produzido pelas pessoas. No entanto REALMENTE creio que uma melhora no desastroso estado do anitube brasileiro (se é que tal existe), passa por uma maior discussão debates sobre o que estamos E queremos criar, assim como dos resultados alcançados.








For Takver

Ancoms não são anarquistas.

  Marxistas e ancoms todos tem a pior ideia possível, de síntese entre a sociedade civil, e o estado. Tais não são estatistas em um sentido ...