(Se fosse o Mr.perfect Cell do abridged realmente ficaria em duvida)
Jiren, sim essa realmente
corresponde a minha opinião, incluindo dragon ball clássico, Z, e GT. Para dar
uma ideia do porquê, iniciarei uma análise dele, e dos aspectos mais amplos da
saga aonde este aparece, o universal survival arc.
Primeiro é importante
contextualizar sua situação em relação ao arco, a mensagem central, que modela
e tem muitos elementos a serviço de, “anime friendship is magic and solves everything”.
Resumindo a saga é sobre amizade, os vínculos e relações que formamos com os
outros, como tais vem muitas vezes a nos definir, sendo a maior fonte de poder
assim como de experiências positivas, possibilitando a busca por felicidade.
(Como não odiar e rir desse design, though)
Esse conceito é personificando na
apresentação do time 7, como um grupo de amigos com laços duradouros, impossíveis
de serem quebrados, e que atuam com um único objetivo fornecendo apoio e
auxilio em vários momentos. Demonstrações mais claras disso vem de como cada
derrota é tratada não como perda individual, mas sim como uma vitória para o
time. N 18, mestre Kame, Kuririn, Gohan, Tenshinhan, passam seus últimos momentos
não pensando que perderam, mas em como podem ajudar o grupo, abrir o caminho
para a vitória com seus sacrifícios. Exatamente em decorrência disso, a chave
do sucesso no torneio passa pelos personagens com objetivos únicos, que se
negam a trabalhar com o universo 7. Ao finalmente se tornar uma unidade,
trabalhando em conjunto, tendo os membros restantes se sacrificando, e atuando
juntos apesar das diferenças, isso possibilita a superação do maior desafio.
Tal dinâmica se enxerga até em relação a outros universos, a amizade e laço
entre Kale, e caulifla, abre o caminho do poder para quase superar o muito
superior Son Goku em batalha.
Outra coisa para se ter em mente
é que o arco trabalha com quase uma reversão de papeis entre antagonistas e
protagonistas. Goku e Vegeta podem ser talvez descritos mais tradicionalmente
como adversários, em termos de função. Eles são as figuras mais ativas,
propondo atitudes, novas ações e situações, modificando o status quo, assim
como são eles que desafiam os ideais de Jiren e Toppo, não o contrário, os
levando a mudanças de mentalidade, e desenvolvimento. Pegue o confronto Toppo x
Vegeta como exemplo, nele temos os ideais de justiça, um idealismo de proteger
diversos valores a qualquer custo, que Toppo apresenta na primeira metade do
arco. No entanto ao ser confrontado com a impossibilidade de manter isso, sua
justiça, orgulho, o símbolo dos pride troopers, por incapacidades pessoais,
este descarta tudo em busca de poder, nascendo o Deus da destruição, Toppo. Um
mero símbolo de força, a capacidade de destruir qualquer coisa em seu caminho,
que não tem valor, ou significado algum.
(É sério, só olha pra esse cara)
Em relação a tal visão temos
Vegeta apresentando uma antítese. Sua
própria versão sobre o que seria se consistir do mais forte, alguém capaz de
proteger tudo que realmente importa, Bulma, Trunks, sua promessa, e orgulho, um
caminho de poder movido pelo desejo de manter seus laços e ideais. O personagem
fala da própria experiência nessa questão, tendo cometido o mesmo erro, se
dispondo a um sacrifício de tudo a sua volta ao permitir ser controlado por
Babidi, na saga BUU. Existe um toque de insulto pessoal, de alguém se tornando
o mais forte, seguindo tal caminho.
A singular situação de arcos
estáticos dos principais, focando na mudança que estes causam nos adversários e
no mundo vem da difícil situação de dragon ball super como narrativa. As histórias
e questões de quase todos os personagens de DBZ se encontram encerradas há
décadas, não havendo muito que fazer além de repetir os mesmos caminhos e
desenvolvimentos, com efeitos cada vez menores. Em grande parte a estrutura que
detalhei acima também se aplica ao clímax do arco, o confronto Goku x Jiren.
Com esta introdução fora do
caminho, posso finalmente chegar à estrela do arco. A introdução e seus momentos iniciais são
algumas das mais enganosas, em relação a intenções em relação a Jiren. No começo ele é esta imensamente poderosa, e
visível ameaça, o qual aparente ser absurdamente vazia em termos de personagem.
Não temos uma personalidade, reações únicas são impossíveis de se achar, sua
impassividade em relação a tudo que está acontecendo é bem estranha, e nada de
suas ações parece indicar uma mentalidade, ou características definidas. Claro a obsessão com força está ali desde o
começo, aliada a um aparente orgulho e convencimento até desmedidos, dando
aberturas a qualquer um que venha enfrenta-lo, em usar seus melhores ataques,
apenas para se mostrar o mais forte.
Tirando uma talvez peculiar necessidade de confirmação se encontram
ausentes quaisquer características definitivas, ou muito em termos de conflito.
Por enquanto minha descrição é a de um particularmente genérico vilão, que é
mais um par de músculos, muito forte, do que um personagem.
No entanto conforme o arco
avança, a rachadura nessa imagem de invulnerabilidade, ausência de sentimentos
e fraquezas que Jiren projeta começa a se mostrar. Na verdade o anime
diretamente menciona tal percepção, quando o n°17, questiona o personagem,
quanto a que diabos ele poderia querer, não imaginando nele, qualquer desejo ou
existência além da busca por poder.
Nesse momento uma janela para seu passado se abre, um de intensa luta,
desejo e determinação, mas cercado pelas sombras de constantes fracassos e
relacionamentos desfeitos.
(É assim que um edgelord de respeito tem que parecer)
O aspecto mais marcante de sua backstory
é a temporalidade de todas as interações que Jiren forma, e a submissão destas
a poder. Durante sua vida existiram diversas pessoas, as quais importaram, seus
pais, família, mestre, companheiros de luta. Durante muitos anos ele se
esforçou junto a elas, tomando um caminho paralelo, ficando mais forte, criando
laços, cooperando e mantendo aqueles importantes por perto, com o intuito de
alcançar seus objetivos. Mas existe apenas uma resposta ao final desse caminho,
o fracasso, impotência diante da verdadeira força, a realidade que fracos se
unindo nunca serão capazes de realizar algo. Aliada a certeza que a qualquer
momento você pode ser traído, rejeitado, abandonado, perder tudo o que é
importante.
Poder se torna o foco e sua
obsessão de vida, não o meio para se alcançar outros coisas. Jiren acredita que
enquanto for o mais forte nunca vai ter que estar sozinho, não teria que se
sujeitar aos outros, estar aberto ao fracasso, forçando sua vontade em relação
ao mundo, e o obrigando a seguir seus próprios desejos. Sendo o mais forte poderia obrigar o mundo a
segui-lo, criando relações não de cooperação, mas de dependência, aonde todos precisariam
dele, não teriam escolha, ou mesmo como abandona-lo. Esse estado de coisas apenas seria
paradoxalmente possível com o abandono das próprias conexões, fragilidades e
circunstancias, as quais seriam a razão de sua suposta fraqueza, e o que o
levam a perder tudo.
Existe uma contradição
fundamental para entender o personagem e sua história. Porque Jiren
constantemente mostra desprezar a ideia de conexão, dizendo que nunca tais
importam, que alguém suficiente poderoso pode forçar qualquer coisa, sujeitando
indivíduos a sua vontade. Mas ele ânsia por seu próprio passado, a imagem dos
laços que este perdeu, como o fracassado incapaz de realizar qualquer coisa, é
seu desejo, buscando reverter a essa situação com o uso das esferas do
dragão. A nostálgica lembrança dos anos
de felicidade, as pessoas com que viveu, as experiências em que passou com cada
uma delas, o assombram, motivando suas decisões.
No fundo Jiren realmente odeia
estar sozinho, a mera ideia disso ser uma possibilidade é um fator que o traz
imensa instabilidade. Por temer solidão, ela o leva a buscar ser forte, apagar
qualquer caráter de fraqueza, dependência ou confiança nos outros, pois enxerga
nessas características a possibilidade de se machucar. Suas relações, amigos e laços estão unicamente
em um passado há muito esquecido, que ele não consegue se perdoar por ter
perdido. Sua busca por poder na verdade é uma negação da possibilidade de
relacionamentos, que ele pode ser vulnerável, fraco ou sujeito aos outros, pois
imagina que sendo forte nunca terá que passar por nada disso de novo. Não
existira chance de ser rejeitado, o tempo, circunstancias e ações não terão a mínima
possibilidade de abala-lo, pois finalmente alcançou o controle sobre tudo. Ao
mesmo tempo que suas ações e busca por força o levam a sempre se afastar,
ignorar os outros, assim como a realidade a sua volta.
São esses sentimentos que o levam
ao primeiro conflito interessante contra o N 17. Este consiste do personagem, o
qual também perdeu em seu passado o que julgava mais importante, sua humanidade
ao ser transformado em androide. O arco constantemente toca em suas tentativas
de entender, e imitar a natureza humana. Mas sua relação com as lembranças são
completamente diferentes das de Jiren, este se nega a deixar que traumas o
derrubem, eclipsem sua existência, e razão de viver. Muito pelo contrário estes
o motivam, fazem o que ele é, sendo parte importante da experiência humana.
Assim como achou diversas razoes para viver no presente, uma objetivo para trabalhar
por. Logo como alguém olhando para o futuro e enxergando seu imenso potencial, N
17 se opõem violentamente nessa luta, chegando a quase se matar no processo.
Note que em relação a tal confronto a impassividade do Jiren sumiu, ele está
sendo desafiado por alguém que nega a própria razão do viver.
No entanto falta ao personagem a
força, e capacidade de dialogar com Jiren, o forçando a aceitar sua situação. Nesse
ponto a participação de Goku é essencial. Se existe alguma forma de Jiren
justificar sua condição, estar sozinho, é pois imagina ser este o único caminho
para ser o mais forte. Havia claras recompensas, e uma possibilidade de vínculos
duradouras no futuro, graças a isso. Se alguém o superasse, mostrando ser mais poderoso,
mantendo laços, relações, amigos, os protegendo no processo, e provando que conexões
são na verdade a maior fonte de poder, ele perderia sua própria razão de viver.
A busca pela força dava proposito a sua dor e perdas, essas eram um processo necessário
em seu caminho, se afastando do mundo, pois apenas assim alcançaria uma
verdadeira felicidade. Algo não transitório mas duradouro, e apenas por meio de
intensos e infindáveis treinamentos completamente sozinho, seria capaz de
chegar nesse ponto.
(O design é uns 60% da razão que só eu consigo levar o Jiren a sério)
Son Goku ao obter e superar Jiren
com nada do sofrimento, do divórcio quanto ao mundo nega a própria existência do
personagem. Não é fácil de aceitar que tudo que você fez foi para nada, que na
verdade está na sua frente, a pessoa que te superou, mantendo, e orgulhosamente
mostrando as percebidas fraquezas, das quais você se afastou. É exatamente essa constatação e possibilidade
que este enfrenta, e não consegue aceitar durante toda luta, o medo do que ela
pode significar, o levando a superar os próprios limites.
Mas ainda assim Jiren perde.
Goku, seu poder, habilidade, as pessoas a seu lado, e o apoio de seu time o
levando a superar limite atrás de limite, se mostram superiores nesse
confronto. Uma derrota tanto física ao não estar à altura do universo 7, quando
ideológica, ao aceitar o encorajamento e auxilio de Toppo, finalmente o
reconhecendo como amigo em seus últimos momentos. Esta resposta a Toppo é muito
importante, finalmente Jiren é capaz de reconhecer e confiar nos sentimentos dos
outros, respondendo a eles. Enfim a pessoa mais insegura, com dúvidas sobre
toda a realidade aceita a confirmação que o mundo, e pessoas a sua volta tem a
oferecer, e esse momento é de uma beleza singular. Os últimos instantes do
torneio de poder são uma extasiante conclusão, e épico confrontamento, as quais
eu adoro não importa quantas vezes assista.
Talvez fracassos, apesar da dor e
frustração ligados a eles, são realmente o melhor forma de aprendizado. Jiren por meio dessa luta ganhou uma melhor compreensão
sobre os laços e relacionamentos que o fascinam e aterrorizam, o permitindo
recontextualizar a vida e escolhas. Sua existência nunca foi de solidão, seu
afastamento e impossibilidade de se relacionar e confiar nos outros nunca foi
completo. Mesmo ao buscar uma lenta morte, em uma obstinada busca por poder,
ainda assim criou uma conexão com Toppo. Até o combate que era apenas um método
de se provar o melhor, e que deveria estar sozinho, ainda o permitiu conhecer
Son Goku, compartilhando algo único com este. Um vínculo que termina com um
desejo de reencontro, e uma apreciação pelo tempo que passaram juntos.
Essas são as lições tirados pelo
personagem de sua derrota. Este o permite pela primeira vez aceitar um futuro o
qual realmente deseja construir, e não é apenas uma idealização do passado.
Assim como pela primeira vez se afirmar como pessoa, alguém que quer criar relações
satisfatórias, interagir com o mundo, não vindo a perder de novo.
Para terminar, estou ciente que
existem diversos problemas quanto a forma que os elementos, os quais detalhei
exaustivamente acima, são apresentados. Momentos importantes de seu passado,
são entregados por monólogos de outros personagens de forma preguiçosa. Não existe
um espaço e abertura para realmente dramatizar cada um dos elementos, a
circunstancia e bagagem emocional que Jiren passa na luta, a qual é imensa. E
mesmo eu não tendo um problema quanto a estrutura do arco, concentrando os
fatos importantes do antagonista nos 7 episódios finais (essa é uma saga com
centenas de personagens e lutas, o que diabos deveriam fazer?) este é uma questão
facilmente evitável. Cortar um pouco de lutas, e minibosses aleatórios, para
fazer o arco e desenvolvimento do best boy mais orgânico e dramatizado faria
maravilhas.
Nada disso muda as muitas coisas
que tal saga faz certo. Em termos de antagonistas, com motivação, características,
mentalidade, e ideologia claras, Jiren é facilmente o mais complexo e
interessante dos vilões de dragon ball (o patamar é meio baixo, eu sei). Mas a função
temática é o que realmente o separa, sendo o contraponto, e real desafio, a
moral e atitude do arco. E diria que ele cumpre a ideia de desafiar a noção mais
velha do universo, Anime friendship is magic and solves everything,
admiravelmente bem.
Meu principal proposito aqui era além
de analisar, o talvez mais odiado antagonista de Dragon Ball, era o mostrar que
mesmo quanto a animes ruins analises são importantes. Dizer Dragon Ball Super é
ruim, 3/10, não se incomode é simples. Mas o trabalho do crítico vai além disso,
analisando como os diversos elementos de uma obra de arte se integram, formam o
todo, e os valores que o criador quer passar. Pois mesmo nesses imperdoáveis 3/10,
com pouquíssimas qualidades, existem certas ideias, elementos, ou
circunstancias aproveitáveis, e bons, os quais o crítico deve reconhecer em seu
veredito. O simples fato de algo não alcançar excelência não a torna
imediatamente um completo pedaço de lixo, sem nada a oferecer, essa consciência
é para mim algo que precisa ser mais cultivado.
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