quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Kekkai sensen review


(os lentos passos para viver,  e se autoafirmar, em Kekkai Sensen)


Esta vai ser uma estranha e não usual review de Kekkai Sensen. Numa leitura do anime é fácil defini-lo como uma superficial, mas extremamente divertida série de ação. Nesse ponto tenho uma de minhas muitas discordâncias com a recepção critica a obra. Meu ponto se encontra em defender a própria aleatoriedade em eventos, circunstancias, pouca conexão, e desenvolvimento narrativo, como uma das melhores qualidades do anime.


Em Kekkai Sensen eu acho um trabalho, que entende o apelo mais simples de ação.  Sabe que a emoção nessas historias está na adrenalina, excitação quanto a grandes e bombásticos momentos.  Que no fundo estamos aqui pela energia, explosões a cada segundo, cacofonia e desastre que se consiste desse mundo, entende que a construção, e como chegamos nesse momento de catarse, nem sempre é o principal. É algo que se aprofunda em razão da inconstância, no sentimento infantil, que se movimenta pelo fato de a cada esquina do mundo que somos introduzidos, ter um super vilão com algum esquema megalomaníaco, numa cidade que é constantemente destruída, mas nada parece mudar. Aonde qualquer poder ou habilidade possível, pode se materializar em uns dos seus cantos mais obscuros. Compreende ao contrário de long running Shonen, que nos prendem em centenas de capítulos de desenvolvimento, tediosas construção de historia, detalhamento de mundo e épicas narrativas que agregam muito pouco. Nos poucos segundos, momentos e cenas de HYPE, está o ponto, e apelo de uma boa obra de ação.


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(A calma e satisfação depois da tempestade)


A forma como os personagens são escritos busca capitalizar exatamente nisso. Temos um colorido de variadas personalidades, muitos vindo com suas próprias características, quirks, motivações, aspectos e reações únicas. Sempre escrevendo tais com uma energia, vigor, um senso de self awareness que não é o de preguiçosamente transforma-los em piadas, mas uma capacidade de crer e os representar em completa sinceridade, não importando quão ridículas as propostas, e situações. Não importa que raramente estes sejam psicologicamente profundos, isso está longe de significar algo, mas simplesmente a enorme variedade de poderes, situações, comedia, ação, emoção que os personagens criam, é um dos aspectos fortes do anime.


Existe uma beleza e intriga numa historia que troca, quase sem dar muito importância, entre episódios sobre lutas no submundo do boxe, a busca de uma deusa por amor verdadeiro, que destrói a cidade em seu caminho, o conflito de vida ou morte contra os vampiros capazes de aniquilar a humanidade. Kekkai Sensen é aquela criança hiperativa que a cada momento parece estar tentando se superar, fazer algo novo, aumentar a escala, o absurdo, a cacofonia, as explosões, de uma forma tão sincera que vc não consegue não amar. Tudo isso aliado com um senso de estética e estilo, visto em cada momento, cenário, assim como em alguns dos designs de personagens mais únicos e inesquecíveis da mídia.


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(Essa ED é catchy e estilosa as fuck por sinal)


Esses aspectos são impressionantes, e mereciam uma mais retida analise, mas não é neles que estou interessado. Minha descrição é verdadeira até aqui das várias iterações de Kekkai Sensen, ambas as temporadas, e o manga. No entanto com a participação da diretora, Matsumoto Rie na primeira, a obra alcança outro nível, sendo dela muito possivelmente os melhores elementos, coerência temática, conflito, e efetiva mensagem. Assim focarei mais na contribuição dela a obra, buscando detalhar tais pontos.


Se eu fosse resumir Kekkai Sensen em um tópico, seria de uma intima, e profunda luta contra o desespero. Tal sentimento é pervíssimo na serie, a sensação de ausência de proposito, de que nada vale a pena, uma visão da vida e do mundo como um imenso vagão em movimento, o qual somos apenas um reles espectador, observador. Existe uma vontade de confrontar nossa impotência, capacidade de entender o mundo, realmente reconhece-lo, muito menos vir a ser reconhecido. Se nem num caráter individual, ou mesmo interpessoal junto a nossas pessoas mais próximas, somos capazes de chegar a um mínimo de compreensão, imagine quanto a um universo caótico, que se nega a qualquer definição e simples entendimento.  O que uma simples pessoa pode fazer no meio de tudo?


Essa ideia é literalmente incorporada no King of Despair (esse nome é bom, e edgy demais pra ser traduzido) um espirito da eterna complacência, e tendência ao desespero da humanidade. Este é assombração do final de todo homem, cada idealista, obstinado, confiante, trazendo a perspectiva de que aquilo que aguardava todos eles era o fracasso. Ele observa nas entrelinhas o desenrolar de todas as eras, e apenas achou erros, insucessos, e infelicidades no caminho humano.


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(Crawling in my skin)


De certa forma contraposta, de outras aliadas a tal visão, está a sempre presente em trabalhos da diretora ideia da importância da família, seu lugar único na formação da personalidade, e crescimento (https://heroineproblem.com/2016/04/18/sakura-con-2016-rie-matsumototoshihiro-kawamoto-interview-part-1/). Nada fala mais sobre tal tópico do que a narrativa original do anime, a historia dos irmãos Macbeth, Black e White. Em sua infância os irmãos eram principalmente definidos por seu relacionamento com o outro, como estes se completavam, tinha características e as qualidades contrarias. Este laço movia e impulsionava a vida dos dois jovens usualmente de forma positiva, os movendo a maior empatia, auto conhecimento e compreensão. Na verdade a infância destes foi normalmente feliz, tinham pais compreensivos que sempre os apoiavam, paz, tranquilidade, e principalmente podiam contar um com o outro em todos os momentos.


Mas nisso o mundo, sua casualidade e o absurdo decidiram reagir, dilacerando a tranquilidade, e segurança do lar familiar. Black numa tacada só perdeu tudo, seus pais morreram na catástrofe que mudou para sempre Nova York, White é colocada num estado de semi existência, na qual ela pode desaparecer a qualquer momento. E ele sozinho, é deixado para entender a realidade e o ocorrido.
Humanos que imaginam terem perdido tudo, vendo laços despedaçadas, futuros e perspectivas perdidas, obviamente tendem a abraçar o desespero. Lembranças de um passado muito amado se tornam dolorosas, tristes demais, pois referentes a algo para sempre perdido. O próprio amor e afeto que existiam e eram tudo a um segundo atrás se tornam uma fonte de tormento, dificuldades, e muita dor. É muito mais fácil se esconder sobre a mascara que esse fim era simplesmente inevitável, é obvio que tais iriam acabar, é claro que estas nunca significaram nada e são completamente irrelevantes. Admitir o peso e importância que o que passou teve na sua vida, é muitas vezes muito pior do que simplesmente negar, aceitando o fim como inevitável.


Mas na verdade existe uma mentira e contradição implícita, no fato de Black se tornar o receptáculo do King of Despair. Este finge aceitar o desespero, a não importância de relacionamentos ou qualquer coisa, mas existe outra mascara ali, para suas verdadeiras intenções. O fato de estar trabalhando por um novo apocalipse, extinção da humanidade, são na verdade unicamente motivadas por medo, a vontade de não vir a perder nada mais. Sua irmã, a pessoa que ele mais se importa, sempre esteve junto, e o conhecer melhor que ninguém esta em jogo, sendo a resposta apenas o único meio para salva-la. O que são milhares de vidas, a humanidade, essa cidade e seus habitantes, em frente a uma razão de viver, quanto a qual não imagina uma vida sem? A trágica decadência e espira negativa do personagem é marcada por empatia, sentimentos compreensíveis, e uma demonstração de talvez aquilo mais belo na humanidade, completo desapego em face daquele que ama.


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(The edgiest, edgelord)


É possível achar eventos semelhantes, remições as mesmas ideias na jornada de Leonardo Watch, nosso protagonista. Este também é subitamente tirado do meio familiar e jogado na vida adulta, pela perda de visão por sua irmã, esta circunstância piorada, pois o ocorrido foi resultado de sua própria covardia, incapacidade de protege-la. Tal ato, as consequências dele, o remorso relacionado destroem o personagem, acabando com sua autoestima, e ideia de eu. A motivação inicial de Leo na verdade é uma mentira, ele não vai a Hellsallem’s lot para recuperar a visão da irmã, mas sim para fugir dela. Na cidade este inicia uma vida de autocomiseração, culpa, melancolia preenchendo seus momentos, uma completa ausência de perspectiva ou proposito o marcando. Nada que pode vir a acontecer importa, nada nele é relevante, pois todo o resto eclipsa frente a enorme vergonha, e culpa por sua falha federal.


A insistente definição de Leonardo como um garoto normal pelo anime, está longe de uma observação de fato, mas é uma declaração ideológica sobre sua natureza. Ele é o jovem normal definido por seus olhos, na cidade do extraordinário. O mundo e todos a sua volta estão lotados de magia, mistério, poder, intriga, estranheza, características inestimáveis, o contrapondo como ser mundano e desinteressante. A verdadeira ironia em sua condição é que Leo é capaz de enxergar muito, obtendo os todo poderosos olhos de Deus, mas é completamente cego e obstinado a não ver seu próprio valor.


As jornadas paralelas, não são objeto de coincidência, mas permitem entender os desafios ideológicos, e dificuldades que um personagem traz ao outro. Mas as diferenças de atitude, muitas vezes dizem mais do que semelhanças entre eventos. Ao invés de se deixar definir pelo passado, medo de perda, Leo avança e cresce. Ele tem como principal características sua enorme empatia, desejo de entender e ajudar as pessoas além da medida do possível. Essa postura o permite novas experiências, a de finalmente encontrar Libra.


Longe de querer avaliar Libra como organização, acho importante a definir em termos do Ethos que ela ganha na série. Eles são esperança, um grupo de pessoas lutando por uma causa perdida, olhando e supervisionando a cidade que eles não tem qualquer condição de olhar e proteger. Cada membro é caracterizado pela capacidade de sempre fazer seu melhor, enfrentar as dificuldades, na tarefa ingrata de ajudar a cidade. A abertura de Leo ao mundo, e a realidade além dele o permitem conhecer sua nova família, os indivíduos que o deram esperança e a capacidade de enxergar um futuro.


E nesse ponto vou precisar falar em enorme detalhe do bombástico episodio, que encerra e conclui magistralmente cada ponto levantado na obra. A negação da realidade, e de até de si mesmo do King of Despair atinge seu ápice, jogando o mundo inteiro numa cruel escolha. As opções são claras ao se entender a ideologia deste. Ou finalmente a humanidade seria capaz de rejeita-lo, ocasionando sua morte assim como a de Black, encerrando uma existência que ele mesmo concordaria inútil, e sem valor. Ou este traria um cataclismo, a repetição do fenômeno que causou o violento choque entre a humanidade e o lado paranormal, só que dessa vez em escala planetária. Finalmente mostrando que a civilização que os homens passaram milênios construindo, toda a obstinação, confiança, ideais destes não tem qualquer valor ou significado, e podem ser facilmente reduzidos a nada. A dúvida existencial que o personagem levanta será aplicada em escala universal.


Leonardo é desafiado exatamente aonde este é mais sensível, o senso de impotência e falta de merecimento. A dúvida que o percorre é se este merece intervir, tem a capacidade de fazer qualquer coisa, alguém vulnerável e normal como ele. Mas nisso ele encontra confirmação, cada uma das pessoas da Libra está ali, esperando, mostrando confiança nele. Laços se mostrando a enorme fonte de força, capacidade de seguir em frente.


Nesses termos se dá o confronto entre Leo e o King of Despair. Este reafirmas seus ideais mesmo nesse momento, o mundo está cercado de confiança, pessoas com obstinação e desejo de pará-lo, mas tais são inúteis, urgindo Leo a mata-lo. Mas a situação, vida nunca são tão simples a ponto de apresentar apenas essas duas escolhas. O personagem passou a temporada inteira tentando entender o mundo, seus habitantes, circunstancias, problemas conflitos, para ser realmente aceitável, que essas existências não significam nada. Existem tantas pessoas, nenhuma delas é um mero figurante, cada uma repleta de seus próprios conflitos, circunstancias problemas, ideologias, que simplesmente abstrair um único ideal que os resumiria é absurdo. A negação do anime ao desespero parte não de um lugar de recusa a sua existência, pois a vida esta lotada de conflitos inúteis, desejos não realizados, perdas que parecem reduzir qualquer proposito ou razão, ao nada. Mas de afirmar, isso é o viver, que o mero fato de tentar está errado, que qualquer crença é uma ilusão. Que não faria qualquer diferença, tanto a morte do mundo, quanto a de até uma única pessoa.


Leo na verdade assume um compromisso com essa visão, apesar de não ter capacidade de responder qual o significado e proposito, este deseja continuar vivendo, criando relações, sentido, para um dia realmente apresentar uma resposta melhor em face dessas questões. Kekkai Sensen acha sua tese não numa simples resposta mas numa atitude, método de encarar a vida, enxerga-la, e ainda se motivar, que considero particularmente fascinante.


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(Eyes open for the future)


Indo nesse mesmo ponto, encontramos a resolução para Black. Seus desejos contraditórios são expostos, apesar de se dizer fiel ao King of Despair, este é incapaz de imita-lo havendo no fundo um desejo de viver, existir impossível de suprimir. Também acontece o derradeiro dialogo entre os irmãos Macbeth nesse instante, aonde Black é confrontado em suas vontades. Este dizia estar apenas agindo, buscando salvar sua irmã, e que esse era o único método, mas na verdade ela é apenas um desculpa. White não deseja essa realidade, não quer uma vida de seu irmão preso ao passado, a ela. Na verdade ele a esta usando como justificativa, razão para agir, é ok desistir, considerar que o mundo não tem valor, nada do que eu fiz esta errado, quando na verdade tal perspectiva apenas causa angustia aos dois.


Em tais termos ocorre a reconciliação dos irmãos, ao reconhecer a vontade e desejo um do outro, abraçar os sentimentos e dor referente a perda não como uma desculpa para não tentar, mas sim como a fonte de poder, e capacidade de criar um novo futuro. Black permite a sua irmã escolher seu destino, e se permite aceitar sua própria existência, o calor confiança e amor que sentiram por aqueles que se foram sendo exatamente a razão de conseguir restaurar a barreira que sustenta o mundo. Nesse sentido o personagem abandona o lar familiar, capaz de existir e se afirmar perante os outros, com as lembranças daqueles que eram mais importantes que tudo.
Kekkai Sensen no fundo é uma historia sobre achar esperança, significado em um mundo caótico e desesperado. Busca de qualquer forma demonstrar que não se deve deixar facilmente definir, que um único fato, evento, ou circunstancia venha a eclipsar sua personalidade. Ecletismo é a ideia que Kekkai Sensen vive, e morre por, ao aceitar a confusão, conflito, e incertezas cercando todos os aspectos da realidade Isso encapsulado na jornada de nosso protagonista, Leo, buscando entender a realidade e a si mesmo, progredindo a passos largos ne sentido de aceitar seu valor, em pequenos gestos como não questionar um elogio ao final do anime. Talvez seja meio presunçoso dizer, mas realmente concordo a obra, Leo pode ser um desastre, mas ele com certeza é meu herói.


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 (Mudar é difícil, e isso o anime com certeza entende)



segunda-feira, 2 de setembro de 2019

O melhor antagonista de dragon Ball



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(Se fosse o Mr.perfect Cell do abridged realmente ficaria em duvida)


Jiren, sim essa realmente corresponde a minha opinião, incluindo dragon ball clássico, Z, e GT. Para dar uma ideia do porquê, iniciarei uma análise dele, e dos aspectos mais amplos da saga aonde este aparece, o universal survival arc.


Primeiro é importante contextualizar sua situação em relação ao arco, a mensagem central, que modela e tem muitos elementos a serviço de, “anime friendship is magic and solves everything”. Resumindo a saga é sobre amizade, os vínculos e relações que formamos com os outros, como tais vem muitas vezes a nos definir, sendo a maior fonte de poder assim como de experiências positivas, possibilitando a busca por felicidade.


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(Como não odiar e rir desse design, though)


Esse conceito é personificando na apresentação do time 7, como um grupo de amigos com laços duradouros, impossíveis de serem quebrados, e que atuam com um único objetivo fornecendo apoio e auxilio em vários momentos. Demonstrações mais claras disso vem de como cada derrota é tratada não como perda individual, mas sim como uma vitória para o time. N 18, mestre Kame, Kuririn, Gohan, Tenshinhan, passam seus últimos momentos não pensando que perderam, mas em como podem ajudar o grupo, abrir o caminho para a vitória com seus sacrifícios. Exatamente em decorrência disso, a chave do sucesso no torneio passa pelos personagens com objetivos únicos, que se negam a trabalhar com o universo 7. Ao finalmente se tornar uma unidade, trabalhando em conjunto, tendo os membros restantes se sacrificando, e atuando juntos apesar das diferenças, isso possibilita a superação do maior desafio. Tal dinâmica se enxerga até em relação a outros universos, a amizade e laço entre Kale, e caulifla, abre o caminho do poder para quase superar o muito superior Son Goku em batalha.


Outra coisa para se ter em mente é que o arco trabalha com quase uma reversão de papeis entre antagonistas e protagonistas. Goku e Vegeta podem ser talvez descritos mais tradicionalmente como adversários, em termos de função. Eles são as figuras mais ativas, propondo atitudes, novas ações e situações, modificando o status quo, assim como são eles que desafiam os ideais de Jiren e Toppo, não o contrário, os levando a mudanças de mentalidade, e desenvolvimento. Pegue o confronto Toppo x Vegeta como exemplo, nele temos os ideais de justiça, um idealismo de proteger diversos valores a qualquer custo, que Toppo apresenta na primeira metade do arco. No entanto ao ser confrontado com a impossibilidade de manter isso, sua justiça, orgulho, o símbolo dos pride troopers, por incapacidades pessoais, este descarta tudo em busca de poder, nascendo o Deus da destruição, Toppo. Um mero símbolo de força, a capacidade de destruir qualquer coisa em seu caminho, que não tem valor, ou significado algum.


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(É sério, só olha pra esse cara)


Em relação a tal visão temos Vegeta apresentando uma antítese.  Sua própria versão sobre o que seria se consistir do mais forte, alguém capaz de proteger tudo que realmente importa, Bulma, Trunks, sua promessa, e orgulho, um caminho de poder movido pelo desejo de manter seus laços e ideais. O personagem fala da própria experiência nessa questão, tendo cometido o mesmo erro, se dispondo a um sacrifício de tudo a sua volta ao permitir ser controlado por Babidi, na saga BUU. Existe um toque de insulto pessoal, de alguém se tornando o mais forte, seguindo tal caminho.


A singular situação de arcos estáticos dos principais, focando na mudança que estes causam nos adversários e no mundo vem da difícil situação de dragon ball super como narrativa. As histórias e questões de quase todos os personagens de DBZ se encontram encerradas há décadas, não havendo muito que fazer além de repetir os mesmos caminhos e desenvolvimentos, com efeitos cada vez menores. Em grande parte a estrutura que detalhei acima também se aplica ao clímax do arco, o confronto Goku x Jiren.


Com esta introdução fora do caminho, posso finalmente chegar à estrela do arco.  A introdução e seus momentos iniciais são algumas das mais enganosas, em relação a intenções em relação a Jiren.  No começo ele é esta imensamente poderosa, e visível ameaça, o qual aparente ser absurdamente vazia em termos de personagem. Não temos uma personalidade, reações únicas são impossíveis de se achar, sua impassividade em relação a tudo que está acontecendo é bem estranha, e nada de suas ações parece indicar uma mentalidade, ou características definidas.  Claro a obsessão com força está ali desde o começo, aliada a um aparente orgulho e convencimento até desmedidos, dando aberturas a qualquer um que venha enfrenta-lo, em usar seus melhores ataques, apenas para se mostrar o mais forte.  Tirando uma talvez peculiar necessidade de confirmação se encontram ausentes quaisquer características definitivas, ou muito em termos de conflito. Por enquanto minha descrição é a de um particularmente genérico vilão, que é mais um par de músculos, muito forte, do que um personagem.


No entanto conforme o arco avança, a rachadura nessa imagem de invulnerabilidade, ausência de sentimentos e fraquezas que Jiren projeta começa a se mostrar. Na verdade o anime diretamente menciona tal percepção, quando o n°17, questiona o personagem, quanto a que diabos ele poderia querer, não imaginando nele, qualquer desejo ou existência além da busca por poder.  Nesse momento uma janela para seu passado se abre, um de intensa luta, desejo e determinação, mas cercado pelas sombras de constantes fracassos e relacionamentos desfeitos.


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(É assim que um edgelord de respeito tem que parecer)


O aspecto mais marcante de sua backstory é a temporalidade de todas as interações que Jiren forma, e a submissão destas a poder. Durante sua vida existiram diversas pessoas, as quais importaram, seus pais, família, mestre, companheiros de luta. Durante muitos anos ele se esforçou junto a elas, tomando um caminho paralelo, ficando mais forte, criando laços, cooperando e mantendo aqueles importantes por perto, com o intuito de alcançar seus objetivos. Mas existe apenas uma resposta ao final desse caminho, o fracasso, impotência diante da verdadeira força, a realidade que fracos se unindo nunca serão capazes de realizar algo. Aliada a certeza que a qualquer momento você pode ser traído, rejeitado, abandonado, perder tudo o que é importante.
Poder se torna o foco e sua obsessão de vida, não o meio para se alcançar outros coisas. Jiren acredita que enquanto for o mais forte nunca vai ter que estar sozinho, não teria que se sujeitar aos outros, estar aberto ao fracasso, forçando sua vontade em relação ao mundo, e o obrigando a seguir seus próprios desejos.  Sendo o mais forte poderia obrigar o mundo a segui-lo, criando relações não de cooperação, mas de dependência, aonde todos precisariam dele, não teriam escolha, ou mesmo como abandona-lo.  Esse estado de coisas apenas seria paradoxalmente possível com o abandono das próprias conexões, fragilidades e circunstancias, as quais seriam a razão de sua suposta fraqueza, e o que o levam a perder tudo.


Existe uma contradição fundamental para entender o personagem e sua história. Porque Jiren constantemente mostra desprezar a ideia de conexão, dizendo que nunca tais importam, que alguém suficiente poderoso pode forçar qualquer coisa, sujeitando indivíduos a sua vontade. Mas ele ânsia por seu próprio passado, a imagem dos laços que este perdeu, como o fracassado incapaz de realizar qualquer coisa, é seu desejo, buscando reverter a essa situação com o uso das esferas do dragão.  A nostálgica lembrança dos anos de felicidade, as pessoas com que viveu, as experiências em que passou com cada uma delas, o assombram, motivando suas decisões.


No fundo Jiren realmente odeia estar sozinho, a mera ideia disso ser uma possibilidade é um fator que o traz imensa instabilidade. Por temer solidão, ela o leva a buscar ser forte, apagar qualquer caráter de fraqueza, dependência ou confiança nos outros, pois enxerga nessas características a possibilidade de se machucar.  Suas relações, amigos e laços estão unicamente em um passado há muito esquecido, que ele não consegue se perdoar por ter perdido. Sua busca por poder na verdade é uma negação da possibilidade de relacionamentos, que ele pode ser vulnerável, fraco ou sujeito aos outros, pois imagina que sendo forte nunca terá que passar por nada disso de novo. Não existira chance de ser rejeitado, o tempo, circunstancias e ações não terão a mínima possibilidade de abala-lo, pois finalmente alcançou o controle sobre tudo. Ao mesmo tempo que suas ações e busca por força o levam a sempre se afastar, ignorar os outros, assim como a realidade a sua volta.


São esses sentimentos que o levam ao primeiro conflito interessante contra o N 17. Este consiste do personagem, o qual também perdeu em seu passado o que julgava mais importante, sua humanidade ao ser transformado em androide. O arco constantemente toca em suas tentativas de entender, e imitar a natureza humana. Mas sua relação com as lembranças são completamente diferentes das de Jiren, este se nega a deixar que traumas o derrubem, eclipsem sua existência, e razão de viver. Muito pelo contrário estes o motivam, fazem o que ele é, sendo parte importante da experiência humana. Assim como achou diversas razoes para viver no presente, uma objetivo para trabalhar por. Logo como alguém olhando para o futuro e enxergando seu imenso potencial, N 17 se opõem violentamente nessa luta, chegando a quase se matar no processo. Note que em relação a tal confronto a impassividade do Jiren sumiu, ele está sendo desafiado por alguém que nega a própria razão do viver.


No entanto falta ao personagem a força, e capacidade de dialogar com Jiren, o forçando a aceitar sua situação. Nesse ponto a participação de Goku é essencial. Se existe alguma forma de Jiren justificar sua condição, estar sozinho, é pois imagina ser este o único caminho para ser o mais forte. Havia claras recompensas, e uma possibilidade de vínculos duradouras no futuro, graças a isso. Se alguém o superasse, mostrando ser mais poderoso, mantendo laços, relações, amigos, os protegendo no processo, e provando que conexões são na verdade a maior fonte de poder, ele perderia sua própria razão de viver. A busca pela força dava proposito a sua dor e perdas, essas eram um processo necessário em seu caminho, se afastando do mundo, pois apenas assim alcançaria uma verdadeira felicidade. Algo não transitório mas duradouro, e apenas por meio de intensos e infindáveis treinamentos completamente sozinho, seria capaz de chegar nesse ponto.


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(O design é uns 60% da razão que só eu consigo levar o Jiren a sério)


Son Goku ao obter e superar Jiren com nada do sofrimento, do divórcio quanto ao mundo nega a própria existência do personagem. Não é fácil de aceitar que tudo que você fez foi para nada, que na verdade está na sua frente, a pessoa que te superou, mantendo, e orgulhosamente mostrando as percebidas fraquezas, das quais você se afastou.  É exatamente essa constatação e possibilidade que este enfrenta, e não consegue aceitar durante toda luta, o medo do que ela pode significar, o levando a superar os próprios limites.


Mas ainda assim Jiren perde. Goku, seu poder, habilidade, as pessoas a seu lado, e o apoio de seu time o levando a superar limite atrás de limite, se mostram superiores nesse confronto. Uma derrota tanto física ao não estar à altura do universo 7, quando ideológica, ao aceitar o encorajamento e auxilio de Toppo, finalmente o reconhecendo como amigo em seus últimos momentos. Esta resposta a Toppo é muito importante, finalmente Jiren é capaz de reconhecer e confiar nos sentimentos dos outros, respondendo a eles. Enfim a pessoa mais insegura, com dúvidas sobre toda a realidade aceita a confirmação que o mundo, e pessoas a sua volta tem a oferecer, e esse momento é de uma beleza singular. Os últimos instantes do torneio de poder são uma extasiante conclusão, e épico confrontamento, as quais eu adoro não importa quantas vezes assista.


Talvez fracassos, apesar da dor e frustração ligados a eles, são realmente o melhor forma de aprendizado.  Jiren por meio dessa luta ganhou uma melhor compreensão sobre os laços e relacionamentos que o fascinam e aterrorizam, o permitindo recontextualizar a vida e escolhas. Sua existência nunca foi de solidão, seu afastamento e impossibilidade de se relacionar e confiar nos outros nunca foi completo. Mesmo ao buscar uma lenta morte, em uma obstinada busca por poder, ainda assim criou uma conexão com Toppo. Até o combate que era apenas um método de se provar o melhor, e que deveria estar sozinho, ainda o permitiu conhecer Son Goku, compartilhando algo único com este. Um vínculo que termina com um desejo de reencontro, e uma apreciação pelo tempo que passaram juntos.


Essas são as lições tirados pelo personagem de sua derrota. Este o permite pela primeira vez aceitar um futuro o qual realmente deseja construir, e não é apenas uma idealização do passado. Assim como pela primeira vez se afirmar como pessoa, alguém que quer criar relações satisfatórias, interagir com o mundo, não vindo a perder de novo.


Para terminar, estou ciente que existem diversos problemas quanto a forma que os elementos, os quais detalhei exaustivamente acima, são apresentados. Momentos importantes de seu passado, são entregados por monólogos de outros personagens de forma preguiçosa. Não existe um espaço e abertura para realmente dramatizar cada um dos elementos, a circunstancia e bagagem emocional que Jiren passa na luta, a qual é imensa. E mesmo eu não tendo um problema quanto a estrutura do arco, concentrando os fatos importantes do antagonista nos 7 episódios finais (essa é uma saga com centenas de personagens e lutas, o que diabos deveriam fazer?) este é uma questão facilmente evitável. Cortar um pouco de lutas, e minibosses aleatórios, para fazer o arco e desenvolvimento do best boy mais orgânico e dramatizado faria maravilhas.


Nada disso muda as muitas coisas que tal saga faz certo. Em termos de antagonistas, com motivação, características, mentalidade, e ideologia claras, Jiren é facilmente o mais complexo e interessante dos vilões de dragon ball (o patamar é meio baixo, eu sei). Mas a função temática é o que realmente o separa, sendo o contraponto, e real desafio, a moral e atitude do arco. E diria que ele cumpre a ideia de desafiar a noção mais velha do universo, Anime friendship is magic and solves everything, admiravelmente bem.


Meu principal proposito aqui era além de analisar, o talvez mais odiado antagonista de Dragon Ball, era o mostrar que mesmo quanto a animes ruins analises são importantes. Dizer Dragon Ball Super é ruim, 3/10, não se incomode é simples. Mas o trabalho do crítico vai além disso, analisando como os diversos elementos de uma obra de arte se integram, formam o todo, e os valores que o criador quer passar. Pois mesmo nesses imperdoáveis 3/10, com pouquíssimas qualidades, existem certas ideias, elementos, ou circunstancias aproveitáveis, e bons, os quais o crítico deve reconhecer em seu veredito. O simples fato de algo não alcançar excelência não a torna imediatamente um completo pedaço de lixo, sem nada a oferecer, essa consciência é para mim algo que precisa ser mais cultivado.


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 (Super Broly é um legítimo 3/10, que não vale a pena assistir) 



sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Porque não sou um comentarista político

Imagem relacionada

(Clickbait meramente ilustrativo,não tendo nada haver com o assunto)


No trabalho que construo, uma questão difícil de ser evitada é qual é minha posição, corrente política (ou falta de), por isso já gostaria de me adiantar, apresentando uma justificação. No cenário de tresloucados falando de ciência política online, aonde todos viram um expert e se julgam capazes de comentar detalhadamente o assunto, refutando complexas antigas linhas de pensamento com memes, e sem ler nenhum livro dos autores, tal se torna a tarefa importante de um criador de conteúdo.


Um curto background sobre minhas experiências no tópico, talvez ajude a entender de onde estou saindo. Sou alguém que perdeu muito tempo em variados grupos de discord, discutindo, trocando opiniões, ideias e argumentos, em servidores. Entrei nesse exercício enfadonho muitas vezes, tinha tempo, disposição, confiança em meus argumentos, uma obstinação e fixação com o assunto causada pelas eleições brasileiras, e a enxurrada da “analises” e opiniões que ela trouxe. As conclusões que cheguei no processo, foram um dos poucos benefícios da enorme perda de tempo.


O centrismo político está morto (pelo menos na internet). Achar pessoas das mais diversas crenças e ideologias é o mais fácil, existem dezenas de coisas que nem sabia que existiam como posição, temos legitimas pessoas que se dizem nacional socialista (nazis), comunistas, integralistas, ancaps, anarquistas. Mas os representantes e membros do establishment político são raros, ou quase inexistentes. Ninguém estava defendendo as candidaturas Meirelles, ou Alckmin (os mais próximos do centrão), os defensores de Michel Temer, só apareciam na hora em que se dizia que ocorreu golpe. Talvez o único ponto de convergência, que a maioria parece compartilhar é uma insatisfação sistemática, uma desconfiança quanto a como a política, sociedade e cultura estão sendo guiadas e conduzidas, assim como quanto aos homens, usualmente a frente desse processo. As soluções para o problema, consistem de aonde todo mundo entra em confusão, e parecem estar animados para matar especialmente aqueles que discordam. Ancaps desejam o fim do estado, minarquistas sua minimização e neutralização, anarquistas se voltam contra as estruturas de poder e hierarquias, comunistas contra a ideologia e relações materiais, sociais democratas se apegam a uma conciliação do capitalismo com métodos de redistribuição de renda e atuação do estado. Encontre uma sala de bate papo particularmente interessante, e existem resquícios, ideias e argumentos que remontam a qualquer uma dessas opiniões se digladiando.


Talvez a maior conclusão seja a mais óbvia (por isso minha enorme incompetência pessoal), debater política na internet é um enorme desperdício de tempo.  Não existe um debate e troca de ideias rolando, em nenhum momento em que vc se engaja nessa atividade, mas sim estamos trabalhando com exercícios de poder. Todos se sentem como se sua ideologia e visão de mundo estivesse sendo pessoalmente ameaçada, ninguém está disposto a conceder um ponto, ou propriamente argumentar em debate, só em forçar unilateralmente sua opinião e ideia sobre o outro e a audiência.  Este é um exercício de orgulho, mostrar superioridade sobre o outro, em um assunto ou circunstancia que nunca vai importar para ninguém, além do curto círculo de pessoas em que você está envolvido. E sim eu sou o mais culpado disso na maioria das situações.


Essa perspectiva para mim demonstra a maior fraqueza do ativismo político de internet.  Nesse ambiente ninguém está disposto a mudar de opinião, ter suas clarezas e visões e realmente desafiadas, criando dúvidas sobre seu prospecto e possibilidade. Na verdade, a única coisa que isso acaba atraindo são adversários, pois não importando que crença e ideologia vc proclame, pessoas vão te julgar, e hostilizar unicamente por causa dela.


Existe também um lado cínico, que muitas vezes parece enxergar a situação com mais clareza.  Não importa o quanto vc fale, argumente, acredite numa causa com todo seu ser, buscando mudar a forma como a sociedade se estrutura, isso nunca vai acontecer (pelo menos não em termos de ação individual). O controle da situação material, sua ideologia e instituições que a sustentam são um arcabouço milenar, o qual não existe solução ou alternativa à vista. E não importa o quanto marxistas repitam, temos que prestar atenção unicamente nas formas materiais da sociedade, esta é nossa luta e única chance de liberdade, mesmo que a pessoa queira, ao entrar nessas questões ela deve estar ciente de que há pouquíssima esperança de resultados práticos no processo.


Apesar de racionalmente eu entender a futilidade do exercício, sou muito pouco simpático a tal opinião.  Existe muita miséria, frustração, pobreza, desperdício, um senso de perdas e enormes dificuldades abrangendo muitas pessoas, e a ideia de simplesmente olhar isso e não fazer nada é insuportável. Existimos nessa realidade, vemos essas pessoas todos os dias, observamos seu sofrimento, questões, dificuldades, o desespero de alguém que perdeu tudo sendo uma experiência possível. Mesmo que um caminho de busca pela própria felicidade, achar o valor e significado unicamente na própria existência seja mais justificável e exequível, paradoxalmente não me vejo realizado seguindo essa opção. Isso é um caminho com certas doses de aflição, e dificuldades, que não quero exatamente enfrentar.


E é com esses questionamentos que eu volto ao maior problema, o que eu deveria fazer então por essas pessoas? E essa é simplesmente uma resposta que não alcancei. Não sei responder quanto ao cálculo econômico no socialismo, não vejo qual o caminho da sociedade superar suas desigualdades de classe, para terminar com os efeitos e conflitos da pobreza. Não posso articular e apresentar uma visão desenvolvida sobre a questão de lutas de identidade, suas tentativas de conquista de direitos, e superação de formas de opressão a qual estão submetidas. Nem imagino sobre se é o poder político ou econômico que deveríamos realmente temer ou neutralizar. Não tenho nada indicar quanto a superação, ou resolução de qualquer problema existente, e qualquer resposta que eu possa dar a essas perguntas, seria infinitamente simples demais, e incapazes de lidar com o problema.


Como alguém realmente incapaz de OBJETIVAMENTE responder e confiar nas respostas que estou dando a cada uma das questões que se colocam a frente da sociedade, decidi simplesmente não me manifestar nesses pontos. Não é uma questão de não existirem um lado ou escolha política por minha parte, mas me falta a convicção sobre o que escreverei é o certo, e nem tenho certeza sobre a utilidade ou particular confiabilidade das conclusões que poderiam vir desse trabalho.


Ainda que ao avaliar arte sejam inevitáveis um tipo de julgamento ou ideologia políticas, não posso simplesmente ignorar a ideologia e opiniões do autor, desejo me manter nesse nicho especifico. Crítica de arte, minha exploração de ideias se baseia na criação, manipulação de conceitos e símbolos de um criador.  Diretamente confrontar ideologias e escrever sobre o mundo está muito além do escopo e intenção. Assim sem embargos caso queiram saber ou comentar esse tipo de coisa me perguntem diretamente, adoro fazer rants, e comentários sobre assuntos aleatórios.  Só não esperem nesse espaço, aquela grande “analise” ou palpite ponderado sobre algum grande assunto, ou o governo, pois tal nunca chegará.

(Mas reclamar de youtbers é belo, moral e fácil, então irei continuar fazendo) 


quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Mentalidade anticapitalista review


(Trabalho de um socialista frustrado tentando descontar sua raiva quanto ao homem que refutou sua ideologia de vida)


Ludwig Von Mises, o homem, a lenda. Aquele que entre outras humildes conquistas refutou completamente o socialismo, o demonstrando como impraticável como modo de produção econômico. Uma pessoa que longe de ter suas ideias esquecidas, está no centro do ressurgimento da direita, e é clamado como guru por diversos movimentos habitando as entranhas da internet. Esta será uma discussão de uma de suas obras, e como ainda apresenta pontos importantes, para discussões atuais.


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Importante primeiro estabelecer de que tipo de livro estamos falando aqui. Esse não é uma bem pesquisada, sensível e bem estruturada analise sobre a mentalidade “anticapitalista”. Na verdade eu estaria em apuros se me pedissem para detalhar a estrutura, e formato da argumentação desenvolvida.  Não há absolutamente nada de fontes, dados estatísticos, métodos de se verificar e explorar mais a fundo os pontos levantados.  Mal existe um tema, ou tópico delimitado nesse escrito, indo de forma bem livre entre cultura, psicologia, economia, artes, cinema, empresas, Hollywood, romancistas, cientistas, sem muito porque, ou razão. Tudo só ligado ao vago tópico do anticapitalismo. Conceitos amplos e dificilmente definíveis, como capitalismo, laissez faire, socialismo, e comunismo, são usados de forma abusiva, com quase nada de explicações sobre seu significado, ou do que diabos o autor quer dizer com cada um deles. Então sim, esse é o equivalente acadêmico de uma conversa de bar.


Não entendam a descrição como um necessário juízo de valor, isso está longe de uma sentença de ausência de méritos. Um autor com muito a dizer, em termos de tópicos e conceitos, atrevimento e coragem o bastante, pode fazer uma apresentação dessas fascinante, sem nada de rigor acadêmico, podendo entrar numa longa, provavelmente não muito particularmente profunda discussão sobre varias coisas. E no processo te fazer rever vários conceitos, desafiando muitas preconcepções (esse é o apelo por trás de qualquer blog afinal).


Mises, contudo, falha no erro cardinal de qualquer pretenso comentarista politico. Não se enganem pelo titulo achando que existe um mínimo esforço ou tentativa de entender a mentalidade “anticapitalista” nessa obra. Na verdade o que é impossível achar é um debate franco com a oposição ao autor, ou uma mínima troca de ideias. Serio, em diversas paginas Mises destila ódio a seus opositores, os tachando de burros, desonestos, vis, maliciosos, incapazes e não desejosos de entender a verdade. Existe uma tentativa bem obvia de distorcer, simplificar e demonizar suas posições, ao mesmo tempo em que o autor se nega a dialogar ou abrir espaço para esses conceitos. Perolas exemplificando essa atitude no livro são intermináveis, este é o responsável por brilhantes afirmações como o socialismo é resultado de invejosos, frustrados com sua situação de vida e fracassos pessoais, tentando destruir a ordem vigente. Que nenhuma pessoa verdadeiramente inteligente pode defender o comunismo tendo boas intenções, e os intelectuais do movimento são maliciosos tentando se aproveitar da situação e desconhecimento das massas. Ou que não existem diferenças entre welfare state, socialismo e comunismo, é tudo no fundo comunismo. E isso só me mantendo nas expressões utilizadas mais marcantes, ataques gratuitos, assim como diversas tentativas de generalizar e apresentar socialistas como a mais vil oposição são abundantes.  Essa mentalidade não é um objeto para dialogo e entendimento, mas sim algo que deve ser exterminado e destruído. Há até um trecho até que o autor defende de forma bem hipócrita, que um estado que simplesmente removesse essas opiniões e pessoas, mas mantendo a liberdade de expressão para outras seria o ideal, mesmo que impossível de existir.


Contrastado a esses infames anticapitalistas, está a figura do capitalismo, perfeito e ausente de problemas, apesar de odiado por invejosos.  Assim como a de seu pobre profeta, Ludwig Von Mises, que é perseguido, e ignorado por sindicatos, editoras, e pelo meio acadêmico, apesar de estar certo sobre absolutamente tudo (sim ele literalmente se afirma como objeto de perseguição de esquerdistas). E sim as camadas de autoindulgência, e fabricação sobre a realidade que este livro está disposto a ir são demais para mim.


No fundo essa indulgencia e complexo, de ser o não compreendido e perseguido, apesar de melhor que os outros, não são o problema, mas a atitude toda desse livro é difícil de perdoar.  O maior problema e dificuldade da humanidade (especialmente em campos sensíveis como politica e economia) é nossa incapacidade de propriamente dialogar com os outros, entender suas crenças.  Todos estão prontos a qualquer instante a demonizar a oposição, culpa-los por todos os problemas e dificuldades que existem no mundo, sem qualquer abertura a outras opiniões.  E eu considero esse tipo de mentalidade um desastre, se temos certeza da validade de nossas proposições, e que sabemos o certo para a sociedade, é apenas por meio do debate de nossos ideais, seu poder de convencimento e capacidade de persuasão da validade de seus méritos, que podemos aplicar esses pontos. Cada ser humano em especifico é absolutamente ignorante sobre a realidade como um todo, e tem muito a aprender com as pessoas que interage, não importando o quanto possa vir a discordar delas. Eu tentei fazer essa ponte vindo a ler sobre a escola austríaca, pois mesmo não sendo exatamente simpático a muitas de suas posições encontrei diversas pessoas que o são. Com o objetivo de melhor entender suas razoes, já que mesmo que não concorde, talvez elas tenham um ponto ou estejam corretas sobre a forma como a sociedade deva se estruturar. No mínimo eu esperava absorver um conhecimento e realidade, que eu não tinha antes, o que também são aspectos importantes.  Por isso ter um autor tão resoluto, teimoso, raivoso contra tudo e todos, e orgulhoso de sua tentativa de não tentar entende-los é tão difícil de aceitar.


Mesmo odiando cada segundo lendo essa obra, existe uma boa lição e questionamento para se tirar daqui. Não é toa o ressurgimento e força atual de Von Mises no debate atual, com o crescimento de um movimento de internet, que o adora como um Deus.  Especialmente se considerarmos que estamos na era aonde debates políticos são brigas para aniquilar o adversário, conduzidas por youtubers que sabem pouquíssimo dos assuntos que falam, mas que tem multidões de seguidores pela natureza do conteúdo extremo que produzem. Esse livro permite antever e compreender melhor não o anticapitalismo, pois feito por alguém completamente alheio a este, e que não quer entender nenhuma de suas posições. Mas o anticomunismo, comunismo se apresentando como o inimigo máximo da humanidade, algo a ser destruído, e visto numa variedade movimentos, circunstancias e aspectos absurda. Esta sendo talvez a maior contribuição, e razão para relevância desse trabalho.


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(Não, eu não vou ler ação humana, já viu o tamanho daquele negocio?)

domingo, 4 de agosto de 2019

Four ways to forgiveness review


Bem vindos a minha tentativa de mostrar a qualidade da melhor autora de todos os tempos, com minha péssima escrita e argumentação


Elogiar um trabalho da autora Ursula Le Guin beira a redundância, sendo suas qualidades extremamente bem conhecidas. Este livro marca sua volta ao universo do ciclo Hainish, iniciado décadas antes, e é uma nova demonstração das qualidades de seu trabalho.


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A perspectiva sobre sci-fi executada é consistente com obras anteriores. Tecnologias futurísticas nesses livros nunca são exercícios mentais para imaginar como será o futuro, mas buscam apresentar como esses aspectos afetam e informam a vida, conflitos e situações dos personagens, e suas sociedades. Sim existem armas de destruição em massa, uma enorme rede de comunicação ligando instantaneamente vários planetas e povos, naves capazes de viajar na velocidade da luz. Mas essas tecnologias importam não como abstrações cientificas, mas sim conforme seus efeitos psicológicos, como uma sociedade com essas tecnologias funcionaria, quais seriam a natureza dos conflitos que ela geraria, como elas permitem várias experiências e situações dos personagens. Todas são relevantes como meio de entender narrativa, e entender este mundo e seus habitantes.


O livro é único em relação a obras anteriores da autora (que eu tenha lido claro), pois apresenta uma atualização de seu conflito e sociedades para mais diretamente responder questões políticas atuais. Não mais existem as claras alusões e referências ao ambiente político da guerra fria (a batalha por supremacia entre Karhide, e Orgoryen em the left hand of darkness sendo o mais claro exemplo dessa tendência). Neste livro somos introduzidos a diversas questões paralelas e relevantes no movimento da descolonização do continente africano, a relação Werel – Youwe claramente evocando a situação colonizador colonizado. O Ekumen também assume papel moralmente mais ambíguo, agindo como união de planetas que existe em semelhança com a ONU, que em ocasiões mitiga conflitos e promove a paz, em outras atua como fator desagregador, trazendo instabilidade a costumes e práticas das sociedades.


Talvez uma das questões mais feitas na história da humanidade, é a do que acontece no dia seguinte a uma revolução, e uma das que autora está mais interessada a resolver. As vozes clamando por injustiças a mudanças drásticas em como uma sociedade funciona, para resolver seus problemas e injustiças, são inúmeras, mas existem poucas perspectivas claras sobre como reconstruir uma sociedade, após destruir suas estruturas de controle, e a ordem anterior.


Dessa questão decorre um dos maiores conflitos da obra. Claro, lutar e destruir um governo despótico baseado em exploração e literal escravidão da população de um planeta, nunca é questionado como causa injusta, algo que vale a pena se lutar e morrer fazendo. Mas o que substitui esse governo totalitário são diversas consequências inesperadas, agitação da população, instabilidade política, guerras civis entre líderes regionais, e a população feminina tendo seus direitos e autonomia resguardados de forma ainda pior, como pessoas livres, do que no governo anterior.


O objetivo é mostrar como não se fabrica uma sociedade com ideais como liberdade, ou uma simples troca do governo como resolução de todos os problemas. Existem marcas e consequências de um processo colonizatório, aonde ler e escrever era proibido para escravos e punível com morte, que são extremamente difíceis de superar. Não existe uma estrutura métodos econômicos e bens, para promover uma vida, educação ou a infraestrutura minimamente adequada para a maioria da população. Também tenta apresentar como as diversas questões e conflitos pelos quais essa sociedade passa se relacionam, a questão racial relacionada a de gênero, que está junto com a questão educacional dessa população e as inúmeras tensões sociais. Apenas com o reconhecimento dos inúmeros pontos de atrito em jogo nessa sociedade, é possível que esta realmente avance e resolva suas contradições.


Juntando essas ideias em 4 historias separada temos nossos personagens. Le Guin nunca está contente em simplesmente mostrar vítimas, opressores e oprimidos, uma luta entre o bem e o mal, sempre buscando observar e escrever sobre um assunto de pontos e formas diferentes. A estrutura de várias histórias permitindo a autora apresentar diversas perspectivas, seguimos o principal líder da revolução, que se desgraçou como político e vive em quase exilio, senhores de escravo, um soldado que acredita fielmente nas divisões e instituições de sua sociedade, embaixadores de outros mundos observando a situação, escravos fugidos, e uma mulher que perdeu tudo com a revolução.  Todos trazendo uma ideia, uma visão e forma de ver o conflito únicas, permitindo entender e ter a experiência do evento histórico e da vida nessa sociedade de formas diferentes. Não existem claras dicotomias, mas uma franca abertura e capacidade de debater cada um dos tópicos que o livro quer explorar, por todos os lados possíveis, a exaustão. Cada personagem principal trazendo um componente novo. Isso constitui o tipo de políticas complexa, comentário político meticulosamente apresentado, e fascinante exploração, que não considero que algo como LOGH, apresenta nessa capacidade.


Indo em conjunto com tais aspectos, existem espetaculares personagens, com intimas histórias de suas vidas e situações. Cada uma das 4 narrativas principais sendo estruturada como um romance, relacionada a necessidade de entender, buscar contato e compreensão junto ao outro. Le Guin sempre retrata o político como algo extremamente pessoal, baseado nas visões e questões dos personagens que estamos seguindo. A busca por relacionamentos superar as barreiras de entendimento, sendo de certa forma as mesmas que orientam a busca por paz, convivência, e compreensão entre povos. A solução para cada um dos personagens achar sentido e valor na vida, apesar das circunstancias ruins que se encontram, são sempre as mesmas, por meio do contato, uma disposição para entender e abraçar os outros em sua diferença. Esse é o caminho para aceitação, perdão e felicidade, que a autora advoga em cada um de seus trabalhos.


Apesar de ausente muito do melodrama e do principal que fazem os despossuídos o meu livro favorito, four ways to forgiveness é um excelente livro, que alcança sucesso em tudo que tenta fazer, e não posso recomendar o bastante.

terça-feira, 16 de julho de 2019

Resposta a Vídeo Quest 92 - End of Evangelion.



Para qualquer um em dúvida sobre o que vai encontrar aqui, essa não será uma compreensível bem argumentada e estruturada tese. Este é um estupidamente longo, raciocínio, com ideias aleatórias que tive ao visualizar o mais recente Vídeo Quest https://www.youtube.com/watch?v=YaADn1uec4E. Meu objetivo é manter um nível de diálogo e conversa civilizados, não pretendendo ofender a ninguém pessoalmente, só acho que uma discussão sobre esse vídeo permite entender certos aspectos do melhor filme já criado (no mínimo pelas razoes erradas).


Sexo e morte é aonde a maioria de conversas sobre EOE deveriam começar, (e muitas deveriam terminar) o que pra mim é algo digno de nota. Espero não surpreender ninguém trazendo conceitos freudianos nesse espaço de discussão, sendo a Evangelion notório por isso. Em teoria Freudiana (ou conforme meu limitado conhecimento dela permite distinguir) sexo e morte funcionam como os motivadores de todas as ações, as pulsões humanas principais, sendo situações opostas. Morte simbolizaria o máximo separação entre 2 indivíduos o ponto em que 2 pessoas não tem qualquer possibilidade de diálogo e proximidade, já sexo a maior proximidade, maior forma de união de 2 indivíduos.


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(Eu realmente nao conseguiria sem esses caras)


Entender essa dualidade de conceitos é essencial, quando olhamos a maioria das cenas nesse filme individualmente. Buscando demonstrar a realidade da separação, incompreensão, dificuldade de entendimento criação de laços, ou de existências humanas satisfatórias, EOE, utiliza elementos de tragédia, e apresenta um caráter bem claro em diversos momentos. Sexualidade é normalmente a primeira ação do personagem, uma tentativa de se aproximar e formar uma relação (Gendo dizendo pra Ritsuko que a ama, gendo dando investidas sexuais com a rei, shinji se aproximando sexualmente da Asuka na primeira cena) Usualmente tais tentativas são seguidas de fracassos, incapacidade de comunicar e dar vazão a sentimentos, sendo rapidamente seguidas por morte, tentativas de agressão e ferir a pessoa objeto da ação (Gendo literalmente matando a Ritsuko depois de dizer que a ama, demonstra isso muito bem).


Observar esse ideia dá uma explicação muito melhor para diversas cenas do que a apresentada no vídeo. Acha a explicação de mostrar a Misato transando com o Kaji, como forma de insulta a masculinidade frágil do Shinji algo bem insatisfatório. Primeiro por que Shinji não está sozinho na cena, sendo acompanhado pela Asuka, sendo claramente algo não unicamente sobre ele. E na verdade a reação dela permite muito mais informação. Sua repugnância quanto a esse tipo de atitude, e dizer que nunca faria isso com o Shinji. Na verdade a reação dos personagens é em relação a ideia de sexo simbólico, união e proximidade máxima entre duas almas, a formação de um relacionamento saudável e adulto. Exatamente o tipo de coisa que Shinji acabou de rejeitar, na circunstancia da cena, ao querer começar o processo de instrumentalidade humana.


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(Good vibrations and memories)


Em relação a Asuka, o vídeo também demonstra uma incompreensão da importância da reconciliação da personagem com a mãe no filme, sendo que para mim esta informa todas as ações que toma. A questão da reconciliação com a mãe e aceitação dela, tem que ser tirada do contexto do Shinji, aonde tal representa imaturidade, incapacidade de olhar para o futuro, e crescer, e para as condições especificas dela como pessoa. Asuka é definida durante NGE muito mais por sua independência (mesmo que ilusória) em relação a figuras paternas, não buscando reconciliação ou reconhecimento por parte de uma delas.  Na verdade em todas as circunstancias que esse assunto foi tratado, ela negou que a alma de sua mãe estivesse na unidade 2 (como Rei sugeriu), que esta fosse um ser vivo, ou que ela poderia entender ou se relacionar com sua mãe desse jeito.
Mas as marcas da separação parental também são aparentes nela. Seu desejo de independência é enorme, vontade de não demonstrar fragilidade, dificuldade, se forçando a um crescimento forçado, e a agir como adulta em face de outras pessoas. Sua relação com os outros também é contraditória, uma hora pedindo por reconhecimento, que estes a elogiem, digam quão boa pilota ela é, e ótima em tudo que faz. Ao mesmo tempo em que ela tenta manter eles o mais afastado possível, se negando a compartilhar fraquezas, fragilidades, atacando os medos e inseguranças dos outros a menor provocação. De certa forma ela teme dependência, ser só uma boneca na vida de alguém, e não ter valor capaz de ser a qualquer momento abandonada E mesmo assim falhando em reconhecer, admitir o outro como ser, e se relacionar de forma saudável.


É nesse contexto que entra sua reconciliação com a mulher mais importante de sua vida. Pela primeira vez Asuka reconhece que existe alguém junto com ela, que a luta não é unicamente para chamar atenção quanto a ser especial. Agora a personagem é capaz de se ver não apenas como boneca, a qual foi deixada para ser abandonada, que ela tem valor, pode lutar e se resolver como pessoa. A livre manipulação do ego, com o controle do campo AT, e sua recém formada recuperação e determinação demonstrando esse fenômeno. Ela tomou os primeiros passos para se tornar adulta e alguém capaz de viver sem níveis não saudáveis de confirmação, o que faz ainda mais brutal, sua perda quanto os eva produzidos em massa. Se vc quer entender pq ela rejeita a instrumentalidade, sendo capaz de se afirmar, restabelecer seu ego e corpo voltando a existir, esses momentos explicam muito isso (não o Shinji magicamente desejando ela de volta ao mundo lol).


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(Estou a anos tentando, nunca consegui)


Aqui eu gostaria de fazer um argumento por Shinji Ikari, porque não considero particularmente produtivos os termos e analise realizadas. Dizer se ele é altruísta ou egoísta é quase irrelevante, não tendo nada haver com os verdadeiros problemas, e situações que ele precisa enfrentar. Eu poderia dizer que o personagem é extremamente altruísta, ele pilota o Eva sem aparentemente ter nada a ganhar pessoalmente com isso, arrisca sua vida numa base diária pelos outros, constantemente toma atitudes pela Rei, realiza todas as tarefas domesticas e diárias da casa da Misato apesar de não ter qualquer obrigação disso. Se nega a machucar os outros, mesmo que a severas consequências pra si mesmo, quando enfrentou Toji e Kaworu. Droga a própria ideia dele não fugir apesar de odiar ser piloto e essa vida, se baseia em um se importar com as pessoas desse lugar, e agir de forma empática em relação a elas como demonstrado no episódio 4. Sim existe muito de insegurança e querer que gostem dele, mas fuck ninguém é perfeito e muito menos o Shinji. O problema que ele precisa superar, o crescimento necessário que o filme apresenta, são de uma natureza completamente diferente, não fazendo qualquer diferença se ele é altruísta ou não.


Nada melhor para mostrar isso do que em seu dialogo final com a Misato, a personagem que chegou mais próximo de compreende-lo e formar relação. Tentar fazer o Shinji encarar a realidade não tem nada haver com culpa-lo por ser um egoísta depressivo, ou dizer pra ele entrar no robô. Misato entende as razoes intimas para ele não alcançar sua felicidade, sua incapacidade de aceitar seus erros, a tendência de se machucar e aos outros, por isso simplesmente parecer mais fácil pois se odeia, as tendências a auto sabotagem a qualquer chance de alegria na vida, e a incapacidade de decidir qualquer coisa por si mesmo (sim egotisticamente). São essas tendências, de não conseguir se afirmar nem escolher, simplesmente se escondendo dizendo que apenas os outros devem tomar essas atitudes, dependendo deles para tudo o ciclo interminável de auto ódio e culpa relacionados a toda decisão e momento, são esses os aspectos mais claros que Shinji precisa combater.


Misato tomando a posição empática que ela ocupa junto aos personagens busca desconstruir essa visão, mostrar que erros são uma parte natural do processo de crescimento, que ele vai constantemente falhar, fazer coisas idiotas, machucar pessoas no processo e se arrepender por isso. Na verdade ela entende o quanto o Shinji não quer estar no fucking robô, como é ok para ele fugir e resolver esse capitulo da vida, se isso é doloroso demais para ele. Mas para realmente superar a situação, ele precisa pilotar o EVA novamente, achar sua vontade para viver, superar seu ceticismo e descrenças pessoais. Aonde está minha vontade razão para viver, superar esse questionamento do mérito da existência e da vida do Shinji, não altruísmo e egoísmo, mas conseguir se reconhecer como pessoa, esse é o campo de batalha travado pelo personagem.


Nesse panorama, com um Shinji com mentalidade completamente destruída, e a instrumentalidade começando, que é importante colocar o primeiro estrangulamento. A roupa e o espaço aonde esses personagens estão, estas são uma retomada do episódio 15 de Eva, aonde ocorre o beijo entre os dois, o momento mais próximo que tiveram sendo que a cena se passa quase como uma continuação/antítese desta. Shinji no ápice do seu desespero se lança em relação a Asuka, dizendo ama-la profundamente e que vai fazer de tudo para protege-la. Ambas afirmações são no fundo mentiras, apesar de no fundo haver afeto entre eles, o sentimento na mente dele é sua enorme insegurança, o desejo de ser amado, desejado que as pessoas liguem pra ele, independente de quem seja. Asuka entende isso perfeitamente, finalmente alcançado certa independência, e capacidade de se afirmar, e acreditar em si, não necessitando mais dessa confirmação. Ela rejeita esse amor impessoal, mais preocupado consigo do que com ela, baseado unicamente no medo de estar sozinho.
Nesse momento com sua última relação se quebrando Shinji surta, reage ao fracasso de conexão do jeito normal em EOE, tentando atacar a outra pessoa com a dor, desistindo de sua existência e do mérito de formar relações ou estar junto aos outros, desejando aquilo que consistira da instrumentalidade humana.


Agora vou entrar mais no mérito de diversas interpretações apresentadas no vídeo, e pq acredito que nenhuma delas explica de forma coerente qual era a proposta. E aqui tenho que dizer, a ideia de EOE como escrito baseado em reação negativa dos fãs em relação a série original, especialmente seu controverso final, que incluiu até ameaças de morte aos criadores não tem qualquer sentido. Sim as cartas de morte estão no filme, junto com outras reações, mas o contexto em que elas aparecem novamente é tudo. Elas se colocam na situação de análise de sentimento de rejeição, incapacidade de reconhecimento do eu. O áudio no momento são seguidas declarações de agressão, desentendimentos, rejeições por parte dos outros, que qualquer um passa no seu dia a dia, junto com diversas imagens e momentos da série.


O que faz extremo sentido se considerarmos o que as ameaças de morte querem dizer. Evangelion é segundo o próprio criador, uma obra que estuda os recantos mais profundos de sua alma, se inserindo nos mais diversos personagens, especialmente no questionamento do Shinji sobre existência (eu acho). Aqui Anno retrata junto a ideia universal de rejeição, que a vida não vale a pena, que vc nunca vai ser amado, capaz de ser relacionar, colocando em questão a possibilidade de ser feliz e útil, por meio do seu maior momento de rejeição pessoal, o do público odiando a arte, e obra que ele colocou sua alma e próprio ser na execução. Ao unir sua jornada pessoal com a rejeição universal que o personagem está sofrendo, Anno demonstra como esse é de uma forma seu próprio caminho para existir como pessoa.


Relacionado a essa visão deturbada de EOE como primordialmente uma resposta a recepção da audiência de NGE, se encontra tese do vídeo, em relação à conclusão de personagem do Shinji. Apesar de recorrente, a visão de EOE, como o cenário, tudo se torna completamente errado para o audience surrogate, nosso principal, é problemática por várias razoes. A afirmação do Shinji, de querer que as pessoas e o mundo voltem a sentir dor, é interpretada como um grito de um psicopata, apenas querendo gerar dor e sofrimento no mundo e em todos a sua volta. Quando essa leitura literal completamente perde a ideia do que é sentir dor em Evangelion, um significado estabelecido durante toda a série. Porque EVA é uma história extremamente focada em como as partes dolorosas, os inúmeros ferimentos e desentendimentos que encontramos durante a vida são importantes. É a partir deste que podemos estabelecer relações com o outro, reconhecemos a felicidade, podemos viver o sonho, e dolorosamente construímos a realidade.


Shinji literalmente diz, achei que eu estivesse criando um mundo sem dor (ao desejar pela instrumentalidade). E adivinhe o que era o mundo que ele desejou? Um local aonde nada existia, não restava qualquer senso de eu, apenas um aglomerado indiferente de todas as pessoas que já existiram, relacionamentos pararam de machucar, mas a que custo? Essa negação tanto do eu como do outro com um aniquilamento dos dois, não é uma aproximação por meio do amor e não permite criar qualquer sentimento. Ao viver na instrumentalidade, o humano se recusa a sentir alegria, amor, esperança.


Isso é o pq Shinji quando confrontado por essa realidade, deseja a volta da dor. Longe de um masoquismo, ele literalmente afirma que quer voltar a existir, estar nesse lugar e universo junto a essas pessoas. Pois sabe que apesar de não ter certeza da felicidade, ele sabe que foi feliz, em diversas instancias junto a eles, algo impossível de alcançar na instrumentalidade. Ele quer se permitir sentir a alegria, e um universo de experiências, assim como a dor, e dar um mundo uma chance de escolher e passar por isso, criar um novo futuro. Tanto que o filme narra, qualquer pessoa que assim escolha, pode abandonar o coletivo e passar a ser eu, não apenas o Shinji ou a Asuka. Esse é tanto o caso que as figuras simbólicas que explicam a mensagem ao Shinji, são a representação visual da Rei durante a instrumentalidade, a qual representa a esperança de que humanos venham a se conhecer e estabelecer relações, e a do Kaworu, o qual simboliza o amor possível que humanos podem alcançar. Boa sorte entender qualquer coisa do que esses dois estão falando, se vc enxergar EVA, como o principal querendo espalhar dor e ódio ao mundo.


O cenário apocalíptico criado dessa escolha também é bem relevante. O mundo pôs apocalíptico é bem intencional, como Yui mesmo diz, conforme os humanos achem a vontade para viver qualquer lugar pode ser o paraíso. E essa é a terra para a qual as pessoas estão acordando após o terceiro impacto, um mundo aonde as pessoas que estão lá acharam a vontade de viver. Que importa isso ser literalmente o inferno na terra?


Minha explicação até aqui pode parecer não fazer qualquer sentido considerando o final, o ultimo estrangulamento da Asuka e sua declaração final. Mas aí entra a beleza, e genialidade deste. Imediatamente ao voltar a existir Shinji é tomado pela mesma dor, o mesmo sentimento de inadequação, ser inútil e relacionamentos gerarem apenas sofrimento. Assim volta ao mesmo padrão, infringindo dor a pessoa que não consegue interagir. Essa sequência longe de surpreendente, é algo simbolizado no próprio filme, quando a personagem se recusa a acreditar que existe qualquer esperança, e amor no mundo, e que estes iriam facilmente se romper quando confrontados a realidade, submetidos a solidão de existir. A promessa de uma nova vida ocupa espaço de utopia inatingível.


Um paralelo entre esse momento, e um flashback do passado do Shinji muito ignorado, é algo essencial nessa cena. Este simboliza o momento em que tudo começou, o padrão de relação teria começado a se repetir, e iniciaria o caminho para chegar nesse momento. Nessa memoria, Shinji brinca, tem muita diversão e alegria num parque com algumas crianças, construindo algo grandioso como sinal do laço. No entanto conforme escurece as outras crianças voltam a suas famílias, lentamente se afastam e se esquecem completamente da criança que permanece no parque, a espera de qualquer um que venha busca-lo. Sendo deixado sozinho, com a solidão e sofrimento o tomando, ele parte para destruir o castelo de areia, furiosamente atacando isso, conforme via o que construiu sendo completamente destruído por ele. No entanto no meio as ruinas, o fato de ter ferido, e fugido das relações, a dor relacionado a isso o consume, tomado pelo arrependimento, o levando a desesperadamente se ajoelhar tentando reconstruir a ruina de um relacionamento.


Exatamente a mesma circunstancia acontece no final. Uma pessoa sozinha, não sabe lidar com a solidão e peso do existir, se voltando a acreditar que existe apenas a dor ao se relacionar, e vindo com um desejo de ferir. Ao se voltar violentamente a Asuka, tentando fazer a dor passar Shinji se surpreende, ao invés do julgamento ou uma resposta ao grau de violência visceral que executa ele encontra carinho. Ela busca discretamente conforta-lo com um aceno de mão. É esse pequeno gesto de reconforto que o permite parar, ver outro lado no relacionamento que criou com a Asuka, e enxergar e sentir outro lado nas relações humanas.


O tom de ambiguidade é essencial para fazer Evangelion funcionar. Sendo esta uma narrativa sobre criar a realidade, o valor e sua própria existência a partir de valores pessoais e sua forma de ver o mundo, permitir a audiência criar o que considerar, ou projetar sobre seu encerramento é importante. Shinji pode ter matado Asuka exatamente naquele momento, ou esta pode ter sido a grande virada, para criação de um eu mais maduro, novos laços em sua vida. Simplesmente dar esse tratamento a um tópico como os relacionamentos, e ideias principais da série, é extremamente preferível a interpretação de vida é uma merda, quero fazer todo mundo ter dor e sofrer pra sempre (But hey, this is just my anime theory).


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(Eva week, e o fato que todo mundo decidiu soltar videos sobre EVA, foi a pior coisa que aconteceu)



Esse campo de interpretação não permite deturpar toda a ideia que a série/filme vinham concluindo, nem supor que agora ela é sobre algo que não tem nada haver com o construído, ou com quase qualquer coisa em EOE. Para mim existem amplos sinais de intencionalidade, e pistas claras de rumo de personagem, e ideia que não vão a lugar nenhum considerando que EVA tem um bad ending.
Queria concluir esse texto, explicando o pq é tão importante para mim estabelecer qual é a ideia de EOE, e pq inúmeras interpretações me frustram absurdamente. NGE, e EOE, são ambos no cerne obras preocupadas extremamente em justificar a existência, responder o pq viver, qual o valor de estar aqui, e como posso construir algo da minha vida. E nesse sentido são obras absurdamente inspiradoras para mim, apresentando um dos finais mais pro-vida que consigo pensar, me dá um senso de esperança a experiência dos dois, de conseguir mudar criar uma melhor versão de si mesmo, e de finalmente vir a me aceitar como pessoa. Evangelion me faz sentir extremamente bem, saber que existe no mundo alguém capaz de demonstrar o pessimismo, que conhece todas as razoes, pelas quais a vida pode não valer a pena.  Um sujeito que consegue escrever um personagem frágil, vulnerável e uma péssima pessoa que se odeia de todas as formas possíveis. Mas ainda assim contar a história de como ele, como indivíduo horrível, e ainda assim capaz e merecedor de existir, em que ele escolhe estar no mundo como si mesmo, e vir a conhecer de novo as mesmas pessoas. Uma narrativa sobre se permitir ter a felicidade, finalmente tomando os rumos e assumindo as escolhas importantes durante a vida.


Por isso o Vídeo Quest e qualquer outro vídeo que siga essa abordagem (eu culpo o horrendo vídeo do folding Ideas por iniciar essa trend de interpretar EOE dessa forma) está, para mim, matando Evangelion. Existe uma obra com uma mensagem, uma ressonante ideia pro vida, extremamente bem trabalhada conforme sua duração, e aqui estão esses criadores matando a arte, defendendo que ela tem bullshit niilismo, e é a história de um sociopata querendo causar dor ao mundo. Eles pegam o Magnum opus em ficção, minha razão maior para me comprometer com minha própria vida, e estão diretamente negando e destruindo seu valor e mensagem. Não existe experiência pior que ver um vídeo sobre isso.

For Takver

Ancoms não são anarquistas.

  Marxistas e ancoms todos tem a pior ideia possível, de síntese entre a sociedade civil, e o estado. Tais não são estatistas em um sentido ...